sábado, 20 de dezembro de 2014

As irmãs clarissas e o incêndio no convento

De acordo com o P. Eusebio Arnáiz Álvarez em "Macau, mãe das missões no extremo oriente", de 1953 "a iniciativa de fundar um convento de freiras, deve-se ao macaense António Fialho Ferreira, comandante em chefe (Capitão-mor) da frota de Macau, em cujo espírito brotou tão feliz ideia. Este escritor macaense distinguiu-se em Manila tratando com o provincial da província de S. Gregório Magno sobre a vinda das ditas religiosas, que veio a ser autorizada e facilitada pelo mesmo. Foram escolhidas para esse fim seis religiosas professas, uma noviça e duas postulantes. Como superiora foi escolhida a Madre Leonor de S. Francisco, cujas virtudes os coetâneos tanto enaltecem. Chegaram à cidade do Santo Nome de Deus a quatro de Novembro de 1633, tendo sido recebidas com carinho e cuidadosamente hospedadas, enquanto se lhes preparava um convento com clausura, encerrada no ano seguinte".
António Fialho Ferreira, natural de Sesimbra, estabeleceu-se em Macau como mercador. Foi escrivão da Santa Casa da Misericórdia em 1628 e 1629. Entre 1630 e 1633, período em que foi concedido a Lopo Sarmento de Carvalho o monopólio das viagens do Japão e Manila, foi Capitão Mor da viagem Macau - Manila. Com uma estadia de cerca de 23 anos em Macau, integrou o núcleo de eleitos ou adjuntos na década de 30 de Seiscentos. Em 1638 abandonou Macau em direcção ao Reino, na tentativa de solucionar as dissidências que enfrentava com grande parte dos moradores da cidade. Em Janeiro de 1641, juntamente com o seu filho Constantino Fialho, foi eleito familiar do Santo Ofício. Ostracizado pela elite económica e do poder da cidade, revelou-se pouco influente em 1642 nas contradições em que foram oponentes o Governador do Bispado Frei Bento de Cristo e os Comissários do Santo Ofício, padre Gaspar Luís e Gaspar do Amaral. Assinou o termo de 31 de Maio de 1642 aquando da aclamação de D. João IV.
A primeira noviça macaense foi a filha do próprio António Fialho Ferreira, «ornada de formosura e gentileza, que não só levou após si os olhos de todos, mas os do Divino Esposo» ... Nunca mais faltaram em Macau donzelas, que preferiram as austeridades do claustro aos regalos da família e às esperanças mundanas, vivendo sempre sob a mais estrita observância e florescendo em virtudes; por isso o próprio Leal Senado se preocupou com atender às suas súplicas, fornecendo-lhes a necessária sustentação. E quando no Natal de 31 de Dezembro de 1824 um voraz incêndio lhes destruiu o pobre convento, foi o próprio bispo que, à frente de toda a população, acudiu à salvação delas, proporcionando-lhes imediatamente um asilo, mais tarde seguido da reconstrução do convento. 
O Barão de Bougainville estava em Macau nessa altura e em Agosto de 1826 a revista “The Gentleman´s Magazine and Historical Chronicle” refere isso mesmo:
“M. de Bougainville witnessed at Macao the burning of the convent of St. Claire, the nuns of which were so earnest in remaining faitful to their vows that one of them was burnt: and in order to save the others from the same fate, the priest of a neighbouring parish was obliged to seise, in their presence, an image of the Virgin, and to call on them in the name of the Virgin to follow him.”
De acordo com a Cronologia da História de Macau Século XIX, Volume 3 (de Beatriz Basto da Silva) "o incêndio que ocorreu pelas 20.45 do dia 31 de Dezembro de 1824, ardeu completamente o primitivo Mosteiro de Santa Clara das religiosas franciscanas clarissas, morrendo uma religiosa de 90 anos de idade, a madre Florentina, e salvando-se 31. O incêndio foi devido ao fogo que se pegou às flores de papel do Presépio, assim engalanado, em honra do Deus Menino".
No ano de 1731, D. João Casal, bispo de Macau, estabeleceu que as freiras pudessem atingir o número de quarenta. Porém a maçonaria do século passado não perdoou ao sossego e recolhimento das esposas de Cristo Crucificado, e o Leal Senado tratou de executar o decreto de D. Pedro de 1834, expulsando-as do seu mosteiro. Perdeu assim Macau esse tesouro, que foi em tão largo período a única comunidade de religiosas no Extremo Oriente continental.
Nas duas imagens acima pode ver-se parte do convento (e da baía da Praia Grande) a partir do local onde foi construído o hospital S. Januário em 1874. Mais imagens e uma carta de uma abadessa do convento em 1809 podem ser vistas aqui.

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